Luto: como lidar com a perda na pandemia?
Sabemos que é difícil aceitar o fato mais verdadeiro e inquestionável da vida: a morte, e consequentemente, o luto. Afinal, é uma verdade absoluta que todos nós vamos morrer um dia. Ela é o destino de todos os seres vivos, certo?
Ninguém escapa desse desfecho, mas mesmo assim, passamos boa parte de nossas vidas tentando ignorá-lo ou evitá-lo.
Entretanto, tendo em vista a realidade em que vivemos agora, onde uma pandemia afeta grande parte do mundo, observamos, claramente, a dificuldade para lidar com as perdas, o medo de ser atingido ou de ver alguém que amamos sendo uma vítima fatal do vírus se tornarem mais assustadores ainda.
Não que a COVID-19 seja muito diferente de outros vírus quanto à taxa de letalidade. Ele apresenta uma taxa de letalidade baixa, mas não queremos pensar numa morte assim, não é mesmo?
Aceitar que, de uma forma ou de outra, estamos todos suscetíveis a morte, não é tarefa fácil para muita gente, e isso é normal. Porém, é necessário trabalhar a nossa mente para não entrarmos em pânico e termos serenidade para viver a situação sem desespero.
Neste artigo, apresentaremos:
- Qual é o significado da morte?;
- O que é o luto?;
- As 5 fases do luto;
- Como lidar com a perda e o luto;
- O medo do amanhã;
- Dicas para reencontrar a paz e
- Quando a aceitação chegar, o que virá depois?
Qual é o significado da morte?
Como já sabemos, a morte é considerada um dos maiores medos da contemporaneidade. O fato de não termos conhecimento de como nem quando nossa hora chegará, torna tudo mais difícil e complexo para o entendimento humano.
Entretanto, nem sempre a humanidade temeu a morte como tememos hoje.
No Egito antigo, por exemplo, a morte era um problema diário. Os faraós e nobres, assim como seus escravos, passaram boa parte de suas vidas se preparando para a morte. Geralmente, homens de poder projetavam seus túmulos extravagantes com muita antecedência – mesmo que não sabendo quando iam morrer. Eles não acreditavam que a vida terminaria com a morte física.
Os romanos antigos também tinham um costume que diz muito sobre como eles pensavam na morte. Quando os grandes generais conquistavam uma vitória militar, eles entravam na cidade pelo ‘’beco da honra’’, cercados por várias pessoas, e assim, eram aplaudidos por todos.
No entanto, por trás deles, um escravo deveria repetir uma frase em seu ouvido: memento mori.
Isso significa “lembre-se de que você vai morrer”. Eles não queriam apressar o momento, só queriam lembrá-los de que nenhum triunfo é tão grande que lhe permitirá escapar da morte, seja você quem for.
Sendo assim, o conceito de morte e o ‘’aceitar a morte’’ até hoje é muito diverso e quase que relativo.
No México, como todos sabemos, o dia 2 de novembro – Dia de Finados, é comemorado com muitas homenagens, festas e músicas, ao contrário do que se vê no Brasil, por exemplo, uma vez que a data aqui não é celebrada, e sim, reservada para visitar cemitérios e se resguardar em casa, fazendo orações e preces relembrando aquele que já se foi.
O que é o luto?
O luto é entendido por muitos psicólogos como uma reação à uma perda impactante. E, ao contrário do que muitos podem pensar, o luto não está relacionado apenas à morte.
Perdas de importantes oportunidades, experiências que não voltam mais, grandes mudanças, fins de relacionamentos, mudanças de emprego e outras situações de rompimentos também podem levar ao luto.
Apesar disso, em tempos de pandemia, o luto está principalmente relacionado a forma em que mais é associado: a morte. Saber lidar com notícias diárias de pessoas morrendo por todo o planeta, definitivamente não é fácil e nem confortável para ninguém.
Infelizmente, devemos entender que mesmo com tanta tristeza, esse tipo de acontecimento não está em nossas mãos e foge do nosso controle.
Por isso, é necessário analisar o que está mais próximo da sua realidade para que você aja até onde puder, sempre dentro dos seus limites.
Na maioria das vezes, nós não somos capazes de salvar todo mundo e impedir que coisas ruins aconteçam, dessa forma, é importante aceitarmos o que não podemos mudar e continuar a exercer a empatia por aqueles que mais sofrem.
As 5 fases do luto
O estado de luto pode ser classificado em algumas etapas, que podem variar de pessoa para pessoa. Aqui estão alguns dos principais exemplos:
1. Negação
Essa fase é quando a pessoa ainda não assimilou a realidade e alimenta pensamentos de como voltar para a situação anterior à perda.
A pessoa que está passando por essa fase, procura meios para resolver o que infelizmente não pode ser resolvido e não aceita o que aconteceu, mesmo que ela não tenha culpa nenhuma e não pudesse fazer nada naquele momento para que a morte fosse evitada.
2. Raiva
Na busca por um culpado pela grande perda, direcionamos a raiva à pessoas envolvidas na situação. Médicos, familiares, pessoas do convívio ou, até mesmo, nós mesmos.
É por isso que a raiva também se manifesta na sensação de culpa e não aceitação, pois buscamos incansavelmente alguém que seja responsável pelo óbito, mesmo que muitas vezes, as causas tenham sido naturais, sem a influência exterior de ninguém.
3. Negociação
A negociação assemelha-se muito à negação. É a fase em que buscamos uma solução para alterar o que aconteceu.
Pensamos em tudo que podíamos ter feito de diferente para alterar o rumo da situação, mesmo que em alguns casos não houvesse nenhuma solução existente ou algo que estivesse no alcance de nossas mãos.
Normalmente, as pessoas que passam por essa fase não conseguem viver plenamente o momento presente, pois focam sua energia no passado que já não volta mais.
4. Depressão
Nessa fase, a dor e a tristeza ficam mais fortes e já não há mais para onde correr. As sensações de cansaço, desinteresse, desconexão e solidão fazem parte da fase de depressão. O aperto no coração e a falta da pessoa que se foi surgem de maneira mais agressiva. É quando a saudade escancara.
Por isso, é de suma importância que você se permita sentir todos esses sentimentos. Mesmo que seja difícil, é necessário passar por essa fase e não se privar de viver esses momentos de choro e dor.
5. Aceitação
A saudade sempre irá existir, mas a fase de aceitação costuma vir acompanhada de uma enorme sensação de paz. Após a compreensão do acontecimento, é possível enxergar novamente algumas perspectivas para a vida, mesmo com a ausência de quem se foi.
Aceitação é saber deixar partir quem já não está mais conosco e entender que ainda há muitas oportunidades para crescer e ser feliz.
Como lidar com a perda e o luto
Como o luto costuma vir junto da reclusão, o diálogo se torna muito importante para superá-lo. Se você está passando por esta fase, ainda que seja um processo doloroso, experimente conversar sobre a perda. Escolha uma pessoa de sua confiança, alguém que você se sinta à vontade em estar junto, e conte o que sente.
Experimente falar como a perda aconteceu, relembre as experiências vividas com a pessoa querida, os momentos especiais e as histórias marcantes. O diálogo faz com o que o assunto se torne mais natural e que passemos a encarar a situação com mais força e lucidez.
No entanto, quando o luto se estende por um longo período de tempo e começa a impedir que a pessoa realize as tarefas de seu cotidiano, é sinal de que chegou a hora de procurar a ajuda de um psicólogo, pois o luto provavelmente já tenha se tornado patológico.
Assim sendo, a psicoterapia ajuda muito na organização mental e na diminuição da sensação de caos interno. Com o acompanhamento de um psicólogo, também é possível concluir quais eram os fatores que estão agravando o luto e, com isso, aprender a lidar com a situação de uma maneira mais assertiva.
O medo do amanhã
O ser humano não lida bem com o desconhecido e isso é inegável. Costumamos temer tudo o que não dominamos muito bem ou nunca tivemos contato e, quando o assunto é morte, nossa reação não é diferente. E é justamente por isso, que também precisamos aprender a lidar com o luto.
Dessa forma, o luto é considerado um estado de espírito de introspecção, tristeza profunda e, em alguns casos, negação.
Com a partida de pessoas especiais, é normal sentirmos que a nossa própria vida não tem mais sentido e que estamos perdidos, sem saber como agir no dia seguinte e nos outros que virão, mesmo sem a presença da pessoa que partiu.
A sensação da perda e de vazio causado pela morte nos leva ao sentimento de luto.
Entretanto, mesmo sendo um momento de profunda tristeza, o luto pode, sim, ser saudável. É uma reação normal e, até certo ponto, pode e deve ser vivenciado para que a pessoa que sofreu a perda chegue enfim na fase de aceitação.
Dicas para reencontrar a paz interior, mesmo de luto
A paz interior é uma das experiências humanas mais importantes. Se você não estiver em paz, não conseguirá apreciar as várias coisas boas que possui.
De fato, após uma grande perda, você pode não ser capaz de reconhecer o bem da sua vida porque sente que perdeu o própria sentido de viver.
Entretanto, existem algumas maneiras de conseguir alcançar a paz interior mesmo que ainda de luto, para que assim, você aproveite seus dias de forma mais tranquila.
1. Concentre sua atenção nas coisas que você pode controlar
Por que se preocupar com as coisas que você não pode controlar? Tentar fazer isso certamente não ajudará a manter seu bom humor e o torna menos capaz de realizar qualquer tipo de atividade.
Pergunte-se literalmente: “Isso é algo que eu posso controlar? A preocupação será benéfica de alguma forma?’’
Como ser humano, você precisa saber quais coisas estão sob seu controle. Qualquer coisa além disso pode distraí-lo e colocar estresse em sua vida.
2. Saia um pouco de casa e entre em contato com a natureza
Faça uma longa caminhada no parque ou passe um tempo no sítio de um parente ou amigo no fim de semana.
Você se sentirá positivamente diferente em comparação com o tempo em que ficou sentado de frente para a televisão ou deitado em sua cama 24 horas todos os dias.
Com certeza há algo de pacífico em passar um tempo entre os pássaros e as árvores e descansar do barulho da cidade.
3. Seja verdadeiro em relação aos seus sentimentos
De nada adianta você sentir tristeza ou alegria e não reconhecer verdadeiramente esses sentimentos, sejam eles bons ou ruins.
É necessário ser fiel aos seus sentimentos e permitir que eles aconteçam, para que depois, caso eles sejam ruins, você aprenda e lidar com eles e eliminá-los quando estiver preparado.
4. Tente praticar exercícios físicos
Você já reparou como você se sente bem ao sair da academia? Ou após sair de uma aula de dança, yoga ou ao voltar para casa depois de uma corrida ao ar livre?
Praticar exercícios físicos não é bom somente para o corpo, mas também para a mente, pois auxilia na manutenção de grandes partes do cérebro.
Além disso, a atividade física pode te ajudar a esquecer um pouco as preocupações da vida e a espairecer as ideias.
5. Faça boas ações
Participar de ações sociais, mesmo que pequenas, é uma maneira de mudar o foco, principalmente quando se está passando por uma fase de luto.
Quando você ajuda o outro e pratica boas ações, fica mais consciente acerca dos problemas e das lutas que as outras pessoas também estão enfrentando.
Ainda, sempre que a gentileza é praticada por você, a bondade do próximo é a moeda de troca. E nada melhor do que isso! Assim, você também sentirá orgulho e satisfação quando ajudar alguém.
Até mesmo porque a regra de ouro diz: faça aos outros aquilo que gostaria que fizessem à você.
6. Seja assertivo
Seja aberto e decidido sobre as suas necessidades e desejos. Você não só terá mais chances de conseguir o que deseja, como também se sentirá um pouco mais no controle de sua vida.
Ser passivo com os seus próprios anseios pode resultar em um maior descontrole, o que contraria a ideia de alcançar a paz interior. Seja ousado sem ser agressivo.
Não deixe que os outros fiquem no seu caminho e te impeçam de ser feliz.
Assuma o controle total da sua vida.
7. Faça um exame de consciência
Sempre que possível, reflita sobre os acontecimentos da sua vida e suas atitudes perante a esses ocorridos.
Procure entender como você chegou no lugar onde está e aonde você quer chegar. Depois disso, avalie se você possui as ferramentas necessários para chegar aonde quer e, mais do que isso, se possui pessoas que te apoiam ao seu lado.
Contar com a ajuda de quem te quer bem é indispensável e essencial para conseguir viver em paz.
Quando a aceitação do luto chegar, o que virá depois?
Conclusão: sabemos que após passarmos por todas as fases, a última delas chegará. E o que acontece depois que aceitamos a perda de quem se foi?
Sem dúvida alguma, a vida volta a seguir seu fluxo normal. As angústias, ansiedades e o medo, vão se desfazendo ao longo do tempo e dando lugar aos sentimentos de paz, tranquilidade e determinação.
Ainda assim, é importante não ignorar as fases e as dores do luto e fingir que elas nunca existiram somente porque agora você está novamente de pé e saudável mentalmente.
Dessa forma, reconhecer a existência dos momentos ruins é extremamente necessário para que, além de não repeti-los, fazer com que eles se tornem aprendizagens que você levará por toda a vida e, possivelmente, passará para outras pessoas por meio do bom exemplo e inspiração.
Inpa – Instituto de Psicologia Aplicada, Asa Sul, Brasília – DF, Brasil